Receber uma promoção para um cargo de alta responsabilidade é, sem dúvida, uma grande conquista na trajetória de qualquer profissional.
Mas, ao dar esse passo, muitos se esquecem de um ponto de extrema importância: a partir do momento em que começam a representar uma empresa, já são responsáveis do ponto de vista jurídico.
Todas as vezes que uma pessoa toma uma decisão, está assumindo um risco em nome da organização, que pode ter implicações pessoais e até mesmo criminais.
O artigo 1.016 do Código Civil estabelece que os administradores de empresas limitadas respondem solidariamente perante a sociedade e aos terceiros prejudicados por culpa no desempenho de suas funções.
Já a lei que se aplica às sociedades anônimas é a 6.404/76, que prevê os deveres e as responsabilidades dos administradores.
Isso significa que pessoas em posição de liderança podem ser responsabilizadas pelos seus atos ou por danos causados em consequência das suas decisões, inclusive colocando seu patrimônio pessoal em risco.
O gestor pode ser obrigado a responder pessoalmente na Justiça em casos de ações movidas por funcionários, ex-funcionários, acionistas, clientes, concorrentes ou órgãos governamentais que tenham se sentido lesados em seus direitos.
Decisões erradas ou terceirizadas durante o exercício das atividades administrativas, e que não estejam dentro das leis ou das atribuições de um executivo, têm a chance de implicar em responsabilidade pessoal diante dos danos causados a terceiros.
Um exemplo que ganhou grande repercussão na mídia foi o da Sadia.
Um ex-diretor financeiro da companhia foi acusado de tomar decisões que resultaram em prejuízos bilionários sem conhecimento do conselho de administração da companhia.
Processado pela Sadia por perdas de R$ 2,55 bilhões com derivativos cambiais, ele foi considerado pela empresa o responsável por causar o primeiro prejuízo em mais de 60 anos de história, situação que deu origem à fusão com a Perdigão e à criação da BRF-Brasil Foods.
Mais tarde, o diretor ganhou a disputa no Superior Tribunal de Justiça, porém certamente foram muitos os transtornos e custos que teve.
Essa foi uma situação extrema, é claro, mas existem diversas outras simples no dia a dia pelas quais os gestores podem ter que responder.
Passar uma informação privilegiada para um amigo; assinar uma procuração de um valor acima do que poderia; sofrer acusação de um funcionário por término indevido do trabalho; ser acusado de negligência; não agir em conformidade com leis e regulamentações; ou cometer erros em questões tributárias ou fiscais por informações incorretas ou falta de informação são apenas alguns dos muitos exemplos cabíveis.
Mas, afinal, como o jurídico das empresas e os próprios executivos podem mitigar os riscos envolvidos na questão de responsabilidade individual?
Antes de tudo, o mais importante é ter políticas, responsabilidades e regras muito claras.
O profissional precisa conhecer e compreender a política de alçadas da organização, assim como seu estatuto ou contrato social.
No Grupo Algar, por exemplo, temos uma política de alçadas por área e por setor.
Realizamos treinamentos periódicos com executivos para que eles entendam suas responsabilidades e até onde elas vão, além de darmos suporte recorrente no caso de dúvidas.
Estamos evoluindo, inclusive, para entregar um “kit de responsabilidade do administrador”, reunindo tudo que o profissional da alta liderança precisa saber compilado de maneira didática em um único material sobre as regras da sua função.
Outro mecanismo existente para proteger os executivos são os seguros de responsabilidade civil, chamados de director & officer (D&O).
A criação desse instrumento vem da crise de 1929 nos Estados Unidos, como resultado da quebra da bolsa de Nova York, mas aqui no Brasil só se disseminou a partir dos anos 2000.
Muitos executivos solicitam esse tipo de seguro previamente para proteger seu patrimônio pessoal e cobrir possíveis atos de gestão.
Essa, entretanto, é uma alternativa com um custo muito elevado, que não pode ser contratada por empresas de todos os portes.
Outro contraponto é que, no fim das contas, há uma série de exceções que fazem com que a proteção não seja absoluta.
Em resumo, o D&O não elimina de forma alguma a responsabilidade que o administrador precisa ter na tomada de decisão.
Se não houver conhecimento profundo por parte dele das leis e regras, são altas as chances de depois praticar algum ato que o seguro não abrange.
Nesses casos, vale lembrar, não há meios de se esquivar posteriormente.
Alegar desconhecimento não causa exclusão de nenhuma responsabilidade, pois a lei considera que um gestor tem a obrigação de ter esse conhecimento para o exercício de sua função.
Todo cuidado é pouco na hora de representar uma empresa. Na dúvida, é importante sempre se informar e consultar um advogado. Melhor pecar pelo excesso de cautela do que pelo contrário.
Por Fernanda Santos, Diretora Jurídica e Compliance Corporativa do grupo Algar.